Igor Maciel: João Campos e o risco de assumir uma candidatura antes da hora
Enquanto a governadora tiver uma aprovação mais alta do que a rejeição em Pernambuco, qualquer aposta de João Campos é alta demais.

O evento do PSB com o prefeito do Recife João Campos rendeu muitos recados para adversários e aliados. No geral, a ideia do encontro realizado no interior era mostrar a força dos socialistas em Pernambuco. Isso ficou bem claro quando Campos, evitando dizer se vai ser candidato a governador, declarou que independente de quem seja o candidato “o PSB vai ter um projeto muito forte em 2026”.
A fala foi uma resposta ao momento de palanque em que a militância o chamava de “governador”.
Coreografia
Nos bastidores da política essa coreografia é comum e muito conhecida. O sujeito não diz se é candidato, mas sua assessoria incentiva militantes a pedirem pela candidatura. São os mesmos assessores que também espalham informações, em off, para jornalistas garantindo que “ele vai disputar”.
O objetivo é criar um ambiente no qual o universo parece “sonhar com a candidatura” do assessorado, embora o político, tão humilde que nem cabe em si, diga que “o povo é quem vai decidir isso na hora certa”.
Lembrando
Ao contrário do que muitos, sob incontida empolgação, imaginam, a candidatura de João Campos em 2026 ainda é muito arriscada para ele.
Para ilustrar esse risco, lembro aqui uma pesquisa do Instituto Datafolha, divulgada em julho de 2021. Na época, o então presidente Jair Bolsonaro (PL) tinha 25% das intenções de voto, contra 48% de Lula (PT).
Nas simulações de segundo turno, Lula vencia com 58% contra 31% de Bolsonaro. Na época, a rejeição ao presidente no cargo era de incríveis 59%.
Quase 60% dos eleitores diziam que “não votariam em Bolsonaro de maneira nenhuma”. Mas no fim ele quase venceu a eleição.
No cargo
O risco que Lula correu de perder uma eleição que parecia fácil um ano antes se deu, principalmente, porque o adversário dele, era um incumbente, era o presidente no exercício do cargo, buscando a reeleição.
Na medida em que o pleito foi se aproximando, enquanto Lula tinha a bandeira do PT e um discurso, Bolsonaro tinha a força do seu próprio cargo, a mão poderosa e bastante visível da gestão atuando para mantê-lo no posto.
Estamos falando de alguém que tinha 60% de rejeição e ainda suscitava ódio público por conta da atuação bizarra no evento mais traumático da História do país nos últimos anos, que foi a pandemia. E ele quase venceu.
Em Pernambuco, Raquel está longe de suscitar ódios e tem aprovação acima de 50%.
Onda
Se todos apontam o prefeito do Recife como candidato, por que ele não admite? O risco para João Campos é admitir publicamente que será candidato e ficar impedido de desistir depois, caso Raquel se recupere e cresça.
Embora os assessores tentem criar uma onda em favor dele, não há garantia de que essa onda seja suficiente para sustentar os bons números que o prefeito do Recife possui hoje em pesquisas, como Lula os tinha em 2021, um ano e meio antes da eleição. A tendência é que a governadora melhore quando a eleição se aproximar.
A mão visível da gestão é sempre muito poderosa. E uma derrota do socialista acarretaria um prejuízo de imagem avassalador para ele e para o PSB.
Prejuízo
Por causa da exposição na internet, Campos chega a ser lembrado para disputar até a presidência da República. Caso largue a prefeitura para ser candidato ao governo e perca a eleição, toda a aura de “novidade espetacular” construída com esforço e bons resultados na gestão municipal será jogada no lixo.
Quando for candidato em 2030, chegará com uma derrota nas costas para o grupo da governadora que vai tentar fazer um sucessor. Quando falarem no nome dele para ser presidente da República, haverá quem diga que “ele perdeu até para governador”. O caminho ficaria mais difícil.
Ao contrário, se mandar um outro nome do PSB em 2026 e ele for derrotado, sempre haverá o "perdeu porque não era João". E quem quiser criticar a governadora também sempre vai poder dizer "ganhou porque não era João".
O sebastianismo, movimento português que se sustentava na crença de um retorno do rei Sebastião (1554 -1578), como um "messias", só existiu porque ele nunca voltou. Se a volta acontecesse, o encanto acabaria.
Risco
Enquanto a governadora tiver uma aprovação mais alta do que a rejeição em Pernambuco, qualquer aposta de João Campos é alta demais.
Mesmo no caso de ela piorar sua popularidade, ainda haverá um risco. Basta lembrar que Paulo Câmara, em 2018, tinha 62% de rejeição no ano eleitoral e, incumbente que era, venceu no primeiro turno.
Campos não vai arriscar enquanto houver tempo para responder com subterfúgios como “o PSB vai chegar forte” ou “teremos candidato em 2026”. Serão frases ouvidas por bastante tempo ainda.
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