Cena Política | Análise

Viagem de Lula com a cúpula de Brasília pode ser ponto de virada

O que a cerveja não resolveu, talvez o saquê resolva. Porque a grande reclamação dos políticos é que Lula não lhes dá a atenção que dava antigamente.

Por Igor Maciel Publicado em 29/03/2025 às 20:00

Lula (PT) conseguiu um feito nos últimos dias. O presidente passou uma semana em uma viagem internacional, acumulou bons números, trouxe boas notícias e não falou nenhuma bobagem, nem cometeu gafes internacionais. Deve ser um novo recorde.

O petista acumulou uma lista de resultados positivos em sua passagem pelo Japão e pelo Vietnã, a despeito de toda a expectativa em contrário. O diagnóstico diz respeito à relação do Brasil com os dois países visitados e também com efeito na política local.

Isso ainda não havia acontecido neste terceiro mandato.

Outros tempos

Para começar é bom lembrar que o Brasil não vinha sendo recebido com tanta deferência nos últimos tempos. Quando não foram as divisões ideológicas que atrapalharam, o próprio presidente brasileiro resolvia se meter a protagonista do mundo e escorregava em retórica rasa, como insinuar que “a Ucrânia atacada pela Rússia tinha culpa pelo que estava sofrendo”. Sem falar na relativização da democracia venezuelana, entre outros absurdos.

Japão

No Japão foi diferente. Lula foi recebido com uma deferência que lembrou os primeiros mandatos e evitou falar de improviso. Leu todos os discursos.

Os jornais se referiram a ele como “Líder do Sul Global” e não faltaram elogios a sua conduta pelas autoridades. Deu entrevistas à imprensa e não acumulou nenhuma saia justa.

Para ter uma ideia, o brasileiro foi o segundo chefe de estado a ser recebido pelo imperador japonês, Naruhito, desde que ele ascendeu ao trono. O outro foi Donald Trump, em 2019. Ser recepcionado pelo imperador é a maior honraria do Japão.

Carne, aviões e álcool

Os resultados práticos foram menores do que os mais otimistas chegaram a sonhar, mas deixaram muita esperança. A viagem conseguiu destravar a possibilidade de exportar proteína animal e etanol para o Japão, num mercado de US$ 4 bilhões por ano, e ainda garantiu a venda de aeronaves da Embraer. Os países concordaram em elevar de US$ 11 bilhões para US$ 17 bilhões o comércio bilateral. Além disso, das conversas surgiu a possibilidade de o Japão ter um acordo comercial específico com o Mercosul.

Vietnã

Com o Vietnã o resultado é ainda melhor, porque o acordo para a exportação de carne brasileira foi devidamente concluído. O país importa cerca de 300 mil toneladas de carne e o Brasil entra como origem para esse mercado a partir da visita. O anúncio foi feito pelo ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, que acompanhou Lula.

Aliás, o que não faltou foi gente acompanhando o presidente. E isso é outro fator que chamou bastante atenção para quem entende os detalhes da política de Brasília.

Férias

Nos últimos dias houve quem brincasse que a capital brasileira saiu de férias. Apagaram a luz e só vão acender outra vez quando o avião de Lula retornar.

Com o presidente viajaram dez ministros, além de deputados, senadores, sindicalistas e mais de cem empresários.

Quatro integrantes da comitiva foram muito comentados. O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos), seu antecessor Arthur Lira (PP), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (UB), e o seu antecessor Rodrigo Pacheco (PSD) passaram a semana com o petista.

Existe muita curiosidade para saber como estará o clima entre Executivo e Legislativo a partir desta segunda-feira (31). Não faltaram oportunidades para que todos se entendam e acordos políticos sejam fechados.

Virada?

Embora muitos acreditem que é muito difícil, fato é que se o governo Lula ainda tiver jeito e conseguir operar um milagre de recuperação política até a eleição de 2026, é possível apostar que o ponto de partida será contado no futuro como tendo sido a viagem ao Japão.

Tudo o que a cerveja não resolveu, talvez o saquê tenha dado jeito. Porque uma das grandes reclamações dos políticos com o presidente é que ele não lhes dá mais a atenção que dava antigamente, que ele não tem mais paciência e cansou do xadrez infinito de Brasília.

Algumas horas com todos trancados dentro de um avião podem ter ajudado a relação a melhorar.

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