
O desembargador Bartolomeu Bueno fez críticas a atitude do também desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira, que após ser multado por não utilizar máscara na orla de Santos, por um guarda civil, humilhou o agente e chegou a fazer uma ligação para o secretário de Segurança Pública de Santos para tentar evitar o pagamento da multa. Bartomoleu Bueno, que é ex-presidente da Associação Nacional dos Desembargadores e ex-corregedor Geral de Justiça de Pernambuco, rechaçou a conduta do desembargador paulista durante entrevista concedida à ao programa Passando a Limpo da Rádio Jornal nesta segunda-feira (20).
"Foi extremamente lamentável a a ação desse magistrado lá de São Paulo. Absolutamente incompatível com dignidade da magistratura, ferindo dispositivos do Código de Ética dos Magistrados. Cabe a nós juízes, mais do que qualquer pessoa, cumprir a lei e as determinações legais das autoridade, de modo que é absolutamente inaceitável", afirmou Bartolomeu Bueno.
No episódio registrado na tarde do último sábado (18) na orla de Santos, no litoral paulista, Eduardo Almeida chamou o guarda civil que o multou de "analfabeto" e rasgou o papel da multa. Os próprios agentes gravaram o vídeo da abordagem, que viralizou neste final de semana.
Desembargador do tribunal de justiça de São Paulo, Eduardo Siqueira, é multado por não usar máscara, rasga a multa e ofende guarda municipal.
— maria de fatima godoi ???????????????? (@fatimagodoi) July 19, 2020
Absurdo!!! pic.twitter.com/vg2VPKCWmC
Bartolomeu acrescenta que o ocorrido leva a opinião pública a acreditar que trata-se de um comportamento comum da magistratura. Ele destaca o artigo nº 35 da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN), que impõe aos magistrados uma série de deveres, como "cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício".
"Ele feriu tudo que se poderia esperar de um magistrado. Primeiro era para estar cumprindo o decreto e usar a máscara, isso até como garantia da saúde pública e cumprir o que o guarda determinou de não agir daquela maneira", disse Bartolomeu.
No vídeo, o guarda informa que ele está descumprindo o decreto municipal nº8.944, de 23 de abril de 2020, assinado pelo prefeito de Santos,Paulo Alexandre Barbosa (PSDB). O decreto prevê multa de R$ 100 no caso de descumprimento da norma.
O desembargador pondera que o "decreto não é lei" e afirma que não tem o costume de utilizar a máscara. O guarda sai do carro e insiste para que Eduardo coloque a máscara. "Você quer que eu jogue [a multa] na sua cara? Então faça, aqui, a multa", rebateu o desembargador. "Eu vou fazer a multa e o senhor joga na minha cara", disse o guarda-civil.
Conselho Nacional de Justiça
O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, determinou, de ofício, que a conduta do desembargador Eduardo Almeida Prado Rocha de Siqueira contra um guarda municipal de Santos seja apurada, através de um pedido de providências.
Segundo Humberto Martins, no vídeo há indícios de possível violação da LOMAN e o Código de Ética da Magistratura. "o que impõe a necessidade de averiguação pela Corregedoria Nacional de Justiça". O desembargador foi intimado para prestar informações sobre os fatos no prazo máximo de 15 dias.
No último domingo (19), o TJSP divulgou nota afirmando que a corte “não compactua com atitudes de desrespeito às leis, regramentos administrativos ou de ofensas às pessoas" e diz que vai apurar a confuta do desembargador.
"Eu não gosto de pré-julgar, principalmente um magistrado e como magistrado tenho que ouvir todas as partes e só depois emitir um julgamento a partir das provas, mas eu particularmente estou torcendo para que esse desembargador seja punido como exemplo para a magistratura nacional", complementa Bartolomeu Bueno.
Vídeo
Após o guarda civil insistir para que ele utilize a máscara, Siqueira pega o celular e diz ligar para o secretário de Segurança Pública de Santos, Sérgio Del Bel Júnior. "Del Bel eu estou aqui com um analfabeto, um PM seu aqui, um rapaz. Eu estou andando sem máscara. Só estou eu aqui na faixa de praia. Ele está aqui fazendo uma multa [contra mim]". Na suposta conversa, o desembargador insiste que o decreto municipal não tem força de lei. "Eu expliquei de novo, mas eles [guardas-civis] não conseguem entender", diz o desembargador.
O desembargador tenta fazer o guarda-civil falar no celular com o secretário, mas o agente se nega e pede para que o secretário, se assim desejar, ligue diretamente no celular dele. A suposta conversa termina com Siqueira dizendo que tudo ficaria tranquilo.
"É para fazer o procedimento e rasgar", diz o desembargador. O agente pede para Siqueira dizer seu nome e ele, primeiro, se nega. O guarda insiste e pede os documentos pessoais de Siqueira, que pergunta: "você sabe ler?". "Então leia bem com quem o senhor está se metendo", diz o desembargador. Ainda redigindo a multa, o guarda-civil pergunta: o senhor vai assinar? "Imagina! Isso aí eu vou rasgar", diz o magistrado.
E ele cumpre o que promete. Mas, antes, é avisado pelo agente que se rasgasse a multa e jogasse o papel na praia sofreria uma segunda penalidade por despejo de lixo em via pública.
O desembargador rasga a multa e sai embora caminhando normalmente. A cena choca uma mulher que passa logo em seguida e diz ter visto muita gente na praia sem máscara. "Essa é a quinta autuação que eu faço hoje senhora", diz o guarda.
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