CRÍTICAS IDEOLÓGICAS

Itamaraty distribui apostila para estrangeiros com frase sobre alisamento de cabelos e críticas ao MST e Lula

Material didático, que estava disponível desde 2013, foi retirado após jornais entrarem em contato com o Ministério cobrando explicações

JC
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Publicado em 15/07/2020 às 10:43 | Atualizado em 15/07/2020 às 11:05
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O material é distribuído para embaixadas brasileiras pelo mundo, por meio de Centros Culturais. Segundo site do Ministério das Relações Exteriores, as instituições estão localizadas em 24 países - FOTO: REPRODUÇÃO

Um material didático para estrangeiros que querem aprender português com críticas ideológicas e ataques a movimentos sociais estava disponível, desde 2013, no site do Itamaraty. Em um dos exercícios, o texto pede que o leitor complete a frase: “Se ela alisasse o cabelo, ela () mais bonita” com a conjugação correta do verbo “ficar”. Outro enunciado aponta o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como corrupto. Há, ainda, citações ao escândalo do mensalão, ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e ao aborto. As apostilas foram elaboradas por uma professora que tem uma escola de idiomas em São Paulo.

Quando procurado pela reportagem do Globo, o Ministério das Relações Exteriores reconheceu que o material “não se coaduna com as diretrizes estabelecidas pelos guias curriculares” e, por isso, foi “prontamente retirado da página eletrônica da Rede Brasil Cultural”. O órgão acrescentou que a apostila foi incluída no sistema por “terceiros”.

A série de livros “Só Verbos” estava disponível na página da Rede Brasil Cultural, da Divisão de Promoção da Língua Portuguesa do Ministério das Relações Exteriores. O material é distribuído para embaixadas brasileiras pelo mundo, por meio de Centros Culturais. Segundo site do Ministério das Relações Exteriores, as instituições estão localizadas em 24 países. A autora, Airamaia Chapina, disse ao GLOBO que não foi contratada para fazer as apostilas nem contatada para a sua divulgação. Segundo ela, o material data da década passada.

Em uma das questões do livro, os alunos são orientados a completar a frase: “Se o MST se apropriar das nossas terras, nunca mais conseguiremos reavê-las”.

Outra questão diz respeito ao aborto. “Se as mulheres não abortassem, não haveria tantas clínicas de aborto clandestinas”.

No segundo volume, os estudantes são orientados a completar frases com a conjugação adequada de verbos, entre eles “ficar”. “Se ela alisasse o cabelo, ela () mais bonita”.

Ao Yahoo, a professora Airamaia, que consta como uma das autoras do material, negou ter sido contratada pelo governo Bolsonaro. “O Itamaraty não pediu nada, não me pagou nada, o livro não tem ABSOLUTAMENTE nenhuma ideologia, não defende nenhuma ideia, é só para treinar os verbos e expandir o vocabulário dos meus alunos”, respondeu ela por um aplicativo de mensagens.

Chapina apenas defendeu, ainda, que não há críticas a “absolutamente nada, nem ao MST, nem ao aborto e nem ao cabelo crespo, liso, ruivo, castanho ou loiro”. Disse ainda que é somente “uma professora que da aulas de português e mais nada”.

Quando questionada pelo Globo sobre a menção a Lula e ao mensalão, ela negou cunho político. “Eu nem votei naquela eleição, então, foi um exemplo qualquer. Provavelmente deveria ser algo que estava em voga”, disse a professora, por mensagem de texto.

Nessa terça-feira (14), após retirar a apostila do ar, o Itamaraty publicou um texto dizendo que “será desenvolvido material didático próprio e colaborativo da rede”. A previsão é que o conteúdo fique pronto no primeiro semestre de 2021.

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