HISTÓRIA DO FUTEBOL

Hugo Benjamin sente as dores do trauma de um 7x1 do Sport que pôs fim a sua carreira de técnico

Há 20 anos, ele assumia o comando técnico do Leão e, após uma goleada aplicada sobre o Central, perdeu o emprego de uma forma que até hoje não entende

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Marcelo Cavalcante

Publicado em 05/09/2021 às 10:36 | Atualizado em 06/09/2021 às 8:14
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O dia 17 de junho de 2001 ficou marcado na vida do ex-zagueiro e ex-técnico de futebol, Hugo Benjamin. No comando técnico do Sport, viu, na beira do gramado, o Leão golear o Central por 7x1, em partida válida pelo Campeonato Pernambucano. Benjamin estava no cargo há poucos dias. A goleada serviria para consolidá-lo no cargo, garantiria confiança para seguir adiante. Mas a partida acabou sendo um trauma. Após a vitória, ainda vivendo o clima de comemoração, a diretoria do Leão anunciou a sua demissão e a contratação de Júlio Espinosa. Uma situação que, passados 20 anos, ainda deixa marcas no treinador. "Eu retirei o punhal das minhas costas, mas as feridas continuam abertas", diz.

A passagem de Hugo Benjamin pelo Sport aconteceu na turbulenta temporada em que o clube só respirava a conquista do hexacampeonato pernambucano. Os rubro-negros queriam repetir o feito do Náutico nos anos 60. No entanto, a diretoria errou a mão na quantidade de jogadores contratados. O Leão não teve uma base de time e não mostrava um futebol empolgante. E assim, os treinadores foram perdendo emprego. Começou o ano com Jair Pereira, que foi demitido para que a diretoria contratasse um antigo sonho: o experiente e consagrado Levir Culpi.

Na reta final do Pernambucano, o Sport perdeu para o Central, em Caruaru, por 1x0. O pouco futebol e o resultado negativo causaram a queda de Culpi. Se o sonho não deu certo, qual seria, então, a realidade do Sport. Ficou o suspense imenso na torcida para saber quem seria o técnico.  No dia seguinte, Hugo Benjamin, que estava trabalhando como técnico da seleção de Surubim, recebeu a ligação do então presidente do Leão, Luciano Bivar, chamando para uma conversa.

"Eu cheguei no escritório dele sem saber de nada. Assim que começou a reunião, ele foi logo me dizendo que eu entendia bastante do futebol pernambucano e perguntou se queria ser o técnico do Sport. Tomei um susto. Mas aceitei, claro. Rapidamente, fechamos o acordo. E fui logo sendo apresentado como novo técnico", relembra. O que Hugo Benjamin não sabia era que ele não era o único a ser surpreendido. A diretoria de futebol também não sabia da decisão do presidente.

Hugo tinha história no Sport. Em 1991, quando era preparador físico do Leão, recebeu o convite para ser técnico da equipe dos aspirantes, sendo campeão estadual na categoria.  A ligação de Bivar era a porta que ele queria para retomar a carreira de técnico num grande clube. "Em 2001, quando cheguei, soube que a diretoria havia fechado a Ilha do Retiro para a torcida e para a imprensa. A primeira atitude foi pedir a reabertura do estádio. No primeiro dia de trabalho, deixei a comissão técnica com os jogadores, pedi para abri as sociais do clube e fui conversar com a torcida. A diretoria ficou olhando para mim, surpresa". 

A estreia aconteceu num clássico contra o Santa Cruz, na Ilha do Retiro. Duelo equilibrado, mas que o Santa Cruz venceu, por 1x0, gol de Joãozinho, numa falha incrível do goleiro tetracampeão mundial Zetti. Foi o primeiro grande imbróglio que se envolveu. Hugo informou que faria a troca no gol. Zetti seria o reserva de Ney, ex-Corinthians.  Zetti reclamou à diretoria. O clima pesou. Foi quando começaram a surgir os rumores na imprensa de que o ex-goleiro do São Paulo queria ser técnico do Sport.  No entanto, o experiente  atleta acabou rescindindo o contrato e encerrando sua carreira.

No Estadual, Hugo Benjamin comandou o Sport em mais três partidas, além do fatídico duelo contra o Central: nos empates contra AGA e Náutico, e a goleada sobre o Porto, por 4x0, em Caruaru, sob muita chuva. A maiúscula vitória deu a Hugo moral para manter a escalação do time para encarar Patativa.

Durante a semana de preparação para esse duelo, o volante Leomar, que estava fora da equipe para defender a seleção brasileira, se reapresentou na Ilha do Retiro. Mas Hugo pretendia não escalá-lo. "Eu queria repetir a escalação. Avisei para ele. Só que Valdo (meia, ex-Seleção Brasileira) me chamou para uma conversa e disse: 'Professor, pode me deixar na reserva. Coloque Leomar no time. Ele era um baita profissional", conta.

A fatídica partida contra o Central foi tumultuada. A Patativa abriu o placar, gol de Téo. Logo depois, o mesmo Téo sofreu um acidente, que o fez deixar e seguir para o hospital. O Central não se encontrou mais em campo. O Sport manteve o ritmo forte e goleou por 7x1. O clima positivo nos vestiários foi quebrado quando Hugo foi chamado para uma reunião com a diretoria.

"Entrei e pensei que seria parabenizado pela vitória. A diretoria pediu para que eu sentasse. Foi aí que eu percebi que a história seria diferente. Decidi ficar em pé.  Eles disseram que tinham novos planos e que eu seria demitido. Fiquei indignado. Quando sai, estava tudo escuro e só estava a TV Globo. Não dei a entrevista, eu fui embora sem o carro. Fui andando para casa. O telefone celular não parava de tocar", conta.

Hugo caminhou lentamente para casa. Sem pressa e sem acreditar no que tinha acontecido. "Parei num bar. Tomei dois chopes de uma vez só. Dias depois, sofri pico de hipertensão. Relembrando essa história, não me sinto mal. Mas não esqueço de nada do que aconteceu", relata Hugo, que precisou fazer um tratamento psicológico para superar o trauma, que afetava o seu dia a dia e tirava seu sono.

"Recebi convite do Central e, depois, fui para o Náutico, coordenar o CT Wilson Campos. Foi um escape naquele momento. Mas o futebol perdeu a graça para mim depois daquele 7x1", revela.

TÉCNICO DO ÍBIS

Hugo tem uma vasta história no futebol pernambucano. Começou a carreira como zagueiro do Náutico na década de 66, com 16 anos, vendo de perto as estrelas do hexa campeonato pernambucano. Fora de campo, se formou em educação física. E como teve carreira curta no gramado, se consolidou na preparação física e, em seguida, como técnico.

Durante a sua história, assumiu vários cargos, viveu grandes experiências, entre elas foi a de assumir o comando técnico do Íbis. Era ano 2000 e o Pássaro Preto não estava aliviando para os grandes clubes da capital, tendo inclusive ganho para o Náutico, por 1x0, em pleno estádio dos Aflitos.

Era uma tarde do sábado. O Náutico vinha de uma derrota para o Sport na penúltima rodada e precisava vencer bem para dar uma resposta para o seu torcedor. E nada melhor do que pegar o lanterna Íbis. Era o início do trabalho do então técnico Luiz Carlos Cruz. Só que o Pássaro Preto estava robusto. E com um gol de Marquinhos, ex-Sport, venceu por 1x0. "Lembro que, quando acabou a partida, Luiz Carlos Cruz, veio falar comigo. Ele me puxou e disse: 'Meu time é muito ruim'. Eu puxei de volta e disse: 'Meu time é muito bom'".

Naquele ano, o Íbis havia fechado uma parceria com o Sport que cedia jogadores da base para o Pássaro Preto. Hugo lembra que acertou um contrato que previa  salário de R$ 3 mil mensais e uma premiação extra de R$ 1 mil por ponto ganho diante de Náutico e Santa Cruz.

Hugo Benjamim chegou a ser pressionado para facilitar a vida do Sport nos jogos do Estadual, algo que nunca aceitou e concebeu.  "Na Ilha do Retiro, fizemos uma partida muito equilibrada e perdemos por 3x2, mas jogando bem. A partida terminou com a defesa do Sport rebatendo bola. No outro dia me chamaram para conversar para saber o que estava acontecendo. No duelo de volta, perdemos por 1x0, num gol sofrido nos minutos finais".

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