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Terezinha Nunes: Raquel faz governo técnico e é atropelada pela política

Oposicionistas afirmavam que governadora poderia pagar caro por "erros em série" com a classe política. Não deu outra: a cobrança veio a galope

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TEREZINHA NUNES do BlogDellas Especial para o JC

Publicado em 15/02/2025 às 18:40
Governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), durante discurso na Alepe - Yacy Ribeiro/Secom

Desde que divulgou seu secretariado, na véspera da posse, em primeiro de janeiro de 2023, a governadora Raquel Lyra cumpre o mesmo script usado como prefeita de Caruaru: alijou a classe política de sua equipe, permeada de técnicos, e alimentou um permanente embate com a Assembleia Legislativa.

No início da administração, a explicação dada pelos auxiliares mais próximos da governadora era de que, como prefeita, ela fez um secretariado técnico e se reelegeu sem dificuldades, além de ter tido, em Caruaru, em 2024, 83% dos votos sobre sua concorrente no segundo turno, a candidata do Solidariedade, Marília Arraes.

De lá para cá, uma pergunta ficou no ar: o que deu certo em Caruaru pode dar certo em Pernambuco? Há controvérsias. Logo depois que tomou conhecimento do secretariado da governadora, uma importante liderança feminina pernambucana, com destaque na política e na economia, comentou, em off, a este blog: “espero que ela acerte mas, sobretudo, que entenda que Pernambuco não é Caruaru”, ressaltando que a governadora tinha, além de alijado a classe política, escolhido pessoas que não representavam o estado como um todo. Lembrava o próprio fato do ex-prefeito de Petrolina, Miguel Coelho, não estar no time de secretários.

Pagando o preço

“Ela pensa que está na Suiça” – comentou esta semana um deputado de oposição na Assembleia, lembrando que a governadora poderia pagar caro pelo que chamou de “erros em série com a classe política”. E não deu outra. A cobrança veio a galope. Aproveitando a ausência do presidente da Assembleia Álvaro Porto – em viagem ao Exterior – a oposição assumiu a condução da casa através do 1º vice deputado Rodrigo Farias, do PSB, e acabou elegendo neste sábado – o regimento da Alepe diz em seu artigo 15 que reuniões marcadas para sábados, domingos ou feriados devem ser transferidas para o primeiro dia útil subsequente – os presidentes das principais comissões da casa: Justiça, Finanças e Administração.

A bancada governista ajuizou a causa, pedindo a nulidade das ações do presidente interino, acusado de ter desobedecido a diversos artigos do regimento e ter descumprido prazos por ele mesmo estabelecidos, mas a verdade é que não se conhece na história de Pernambuco um só governador que tenha administrado o estado sem o controle das três comissões citadas que são fundamentais no andamento dos trabalhos legislativos.

Por um triz

No primeiro biênio do seu mandato, Raquel os elegeu por um triz. Antonio Moraes, em Justiça, e Débora Almeida, em Finanças, foram eleitos presidentes pelo placar de 5 a 4. Já naquela época, tinha ficado claro que a eleição das comissões no segundo biênio poderia ser ainda pior. E foi, como está posto. O presidente da Assembleia, deputado Álvaro Porto, que é do mesmo partido de Raquel, o PSDB, mas se estranhou com ela desde o início, acabando por quase romper, é capaz de dirimir conflitos na casa mas viajou de férias ao Exterior entregando o cargo a Rodrigo Farias, um oposicionista ferrenho.

A governadora ainda tem maioria na Alepe, e a prova é a carta assinada por 26 dos 49 deputados esta sexta que embasou a ação judicial contestando o processo eleitoral e acusando Rodrigo Farias de ter descumprido o regimento da casa. Na verdade, mais deputados fora os 26 votam favoráveis à governadora mas são dissidentes dos seus partidos e acabam, como aconteceu na escolha das comissões, somando a favor da oposição, pois nas comissões o que vale é a maioria partidária e não o voto.

O caminho dos prefeitos

Com relacionamento conturbado com os deputados estaduais, a governadora se fixou nos prefeitos para fazer política. Não só elegeu mais de 120 dos 184 prefeitos pernambucanos em 2024, como está chegando direto aos administradores municipais sem passar pelos deputados. “Ela faz um governo municipalista” – diz um prefeito metropolitano. Isso dá certo? Nem sempre. Sobretudo em eleição majoritária. Pernambuco já viu o exemplo do ex-governador Miguel Arraes derrotado por Jarbas Vasconcelos por mais de 1 milhão de votos quando dizia contar com mais de 100 prefeitos.

Esta semana, enquanto a Assembleia pegava fogo em torno da formação das comissões, a governadora ficou dois dias em Brasília em encontro de prefeitas e prefeitos e fez questão de recepcionar os prefeitos pernambucanos no Escritório do estado na Capital Federal, aos quais anunciou a doação de ônibus escolares: “Quando voltarem, passem na Arena Pernambuco para receber os ônibus e levarem direto para seus municípios” – falava a cada um deles, registrando vídeos para suas redes sociais.

Essa ida direta aos prefeitos é outro motivo de contrariedade para os deputados estaduais que estão mais independentes por conta das emendas impositivas. Foram, porém, muito contrariados com o não pagamento das emendas até o dia 31 de dezembro, como prometera a governadora. Na época, houve parlamentar que sugeriu na Alepe a abertura de processo de impeachment contra Raquel, acusando-a de não estar cumprindo a Lei de Diretrizes Orçamentárias. O caso ainda está pendente.

PSB não morreu

Sabendo fazer a política tradicional como ninguém, o PSB era dado como natimorto no início da administração da governadora. Fizera 14 deputados estaduais – a maior bancada na Alepe – mas três deles ficaram dissidentes e um saiu do partido, o deputado Jarbas Filho. Na eleição municipal de 2024, o partido elegeu apenas 31 prefeitos – agora tem 30 porque a prefeita de Lagoa Grande, Catharina Garziera, trocou o PSB pelo MDB.

Mas o partido, mesmo assim, trabalhou nos bastidores da Alepe o tempo inteiro contra a governadora, inclusive reforçando a “independência“ do legislativo. Nesse episódio das comissões, ele chegou ao ponto de entregar as comissões de Justiça e Finanças ao PL bolsonarista e ao União Brasil – partidos que têm cada um cinco deputados – para a oposição vencer o embate. O deputado mais experiente entre os socialistas, Waldemar Borges, só conseguiu a presidência da Comissão de Administração.

Eleição de 26 na mira

Com o nome do prefeito João Campos posto na disputa para governador em 2026, a campanha eleitoral foi antecipada e a governadora pode enfrentar uma situação ainda mais complicada daqui pra frente. A prova foi a tentativa de reaproximação com o ex-prefeito de Petrolina, Miguel Coelho, que era dado como carta fora do baralho entre os candidatos ao Senado do palanque socialista.

Tão logo tomou conhecimento de que os dois tinham tratado também de política, João Campos chamou Miguel para uma conversa e reforçou a possibilidade dele ser um dos seus candidatos a senador, coisa que ainda não tinha feito. A aproximação que favoreceria demais a governadora, se concretizada, só ajudou a Miguel. Embora ele tenha reforçado que não vai fechar a porta para ninguém e dito que será candidato ao Senado, não aceitando ser vice, hoje é visto como um dos candidatos de João. Se não for, aí sim, pode até voltar a se compor com a governadora, mas isso só o tempo dirá.

Confira também: CONFUSÃO NA ALEPE, COMÉDIA NA CÂMARA DOS VEREADORES, LULA E O AÇO | VIDEOCAST CENA POLÍTICA #14

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