Se restavam poucas dúvidas a respeito da natureza ditatorial e mentirosa das últimas eleições presidenciais na Venezuela, a mentira ruiu de vez com a ordem de prisão ao concorrente do presidente Nicolás Maduro, o líder da oposição Edmundo González Urrutia. A ordem saiu da Justiça controlada por Maduro, fechando o cerco ao candidato que denuncia a fraude eleitoral, e foi considerado vitorioso por alguns países, em frontal desafio à posição do regime que não admite deixar o poder. O primeiro efeito imediato deve ser o passo atrás das diplomacias do Brasil e da Colômbia, que buscavam mediar a crise política gerada por um presidente que deseja se perpetuar no posto, à revelia da vontade popular expressa nas urnas e numa oposição crescente – e reprimida com violência pelo aparelho de Estado.
A intimidação contra os opositores ganha nova dimensão com a determinação da prisão de Urrutia, que vem alcançando solidariedade e apoio de lideranças de fora da Venezuela, em seus reclamos de eleição fraudada por Maduro. Foi talvez para que tal apoio não prosperasse ainda mais, dentro e fora das fronteiras, que o sucessor de Chavez resolveu enviar a mensagem de que nem Urrutia, nem qualquer personagem da oposição – a maioria dos líderes, presos – podem ser vistos como alternativas de poder ao ditador de uma nação em fuga, empobrecida e fragmentada.
A oposição na Venezuela é cada vez mais resultante de concessões esporádicas do regime ditatorial, com pouco espaço de crítica, mobilização e real perspectiva de poder. Tudo contrário ao processo democrático, onde a alternância dos governos é um dos pressupostos para a liberdade política, coletiva e individual. A perseguição a Urrutia é a negação definitiva da democracia no país dominado por Maduro e uma casta militar apegada ao poder absoluto. Enquanto isso, a situação da população é dramática, com muitos fugindo para outros países em busca de condições melhores de vida.
À medida em que se fecha para o mundo e para a pluralidade em seu próprio território, a Venezuela se transforma em uma espécie de ilha continental, da qual os próprios habitantes desejam urgentemente fugir – e para a qual, quem já saiu, teme regressar, devido à inexistência de direitos essenciais. Muito pior do que as sanções econômicas, as sanções internas, promovidas por Maduro, encerraram os venezuelanos nessa ilha de insegurança e medo. Considerado mais radical que se antecessor, e menos propenso ao diálogo – mesmo de pura aparência – o ditador vai detonando as pontes até com governos com que poderia manter relações amistosas e produtivas. Mesmo o Brasil de Lula, sempre condescendente com o regime chavista, acusa a pressão de respaldar a evidente violência política na Venezuela.
A espiral da tirania continua a agravar a qualidade de vida do povo venezuelano, e a assustar os países vizinhos que não podem alterar o que está acontecendo, nem fazer de conta que a ilha de Maduro é próspera e livre.