PERNAMBUCO

A ponta de feio iceberg

Aumento dos feminicídios no estado evidencia a continuidade do machismo e da violência contra a mulher, que desafiam as políticas públicas

Cadastrado por

JC

Publicado em 13/07/2024 às 0:00
PEC da Anistia - Thiago Lucas

A frieza da estatística não esconde a dimensão de um problema estrutural, cuja complexidade reconhecida demanda abordagens integradas, na busca por uma solução que não demore – e dure. O crescimento dos casos de assassinatos a mulheres pelo fato de serem mulheres – os abjetos feminicídios – mostra que é preciso mais do que foi feito até agora, em termos de políticas públicas, para reduzir drasticamente esse tipo específico de violência em Pernambuco. O fato de o estado se destacar, há muitos anos, na insegurança dos cidadãos, em diversos indicadores, agrava o problema, mas não exime os gestores públicos, nem a sociedade como um todo, de traduzir em ações um sonoro “Basta!” à violência contra as mulheres.
Nos primeiros seis meses do ano, os dados oficiais registraram 15% a mais no número de feminicídios cometidos em solo pernambucano, em relação ao mesmo período de 2023: 37 mulheres perderam a vida, a maioria, vítimas do ódio, do ressentimento ou do ciúme de homens que demonstram a própria fraqueza através do uso máximo da força bruta para matar outro ser humano. A violência que nasce da frustração de um sentimento tacanho de posse sobre outra pessoa é reconhecida em grande parcela da sociedade brasileira, como cultura machista dominante. Esse machismo, que não se restringe aos homens, mas também afeta muitas mulheres, precisa não apenas ser compreendido, mas intensamente desconstruído, desnaturalizado enquanto fenômeno expresso através do medo, do sofrimento, das cicatrizes e da morte de tantas mulheres.
Os feminicídios representam, na verdade, a ponta de horrendo iceberg. O ápice de uma convivência de assédio e dor, onde a liberdade das mulheres é ameaçada diariamente, até que a própria integridade física se torna uma concessão dos agressores. Daí porque se reveste de importância o estímulo para que as mulheres e seu entorno denunciem o que está acontecendo. “A maioria das vítimas de feminicídio nunca denunciou algum tipo de violência sofrida, por isso a gente insiste para que as mulheres denunciem no primeiro sinal. Nunca é demais bater nessa tecla", declarou ao JC a delegada Fabiana Leandro, gestora do Departamento de Polícia da Mulher. Para se ter uma ideia da dimensão desse mal, basta saber que, somente em Pernambuco, no primeiro semestre, foram recebidas nas delegacias mais de 26 mil queixas de violência doméstica ou familiar, numa média de quase 150 denúncias por dia. E ainda assim, os feminicídios cresceram. Para os especialistas, o número real pode ser muito maior, já que para denunciar, muitas precisam passar por cima do medo de represália dos agressores.
As campanhas devem continuar. A informação preventiva, circular nas ruas e praças, nas escolas, para que as novas gerações não perpetuem a cultura machista. Aos governos de todos os níveis, por sua vez, cabe a responsabilidade de cuidar melhor do apoio às mulheres, bem como não deixar que a impunidade ganhe terreno. O feminicídio não pode mais crescer, tem que parar.

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