O triângulo do fogo é uma representação dos elementos necessários para que ocorra a combustão. Desde a infância, entendemos que é preciso ter comburente, combustível e calor para se propague o fogo. Na ausência de algum desses elementos, não há queima. Se quiséssemos lançar mão desta figura para descrever a ciência, poderíamos simplificar toda uma estrutura complexa em três elementos: investimento, estrutura e pessoal. Este seria o triângulo virtuoso da ciência. O investimento que vem do governo e das empresas é crucial para alimentar a produção do conhecimento.
E neste balanço entre público e privado, sabemos que o financiamento público predomina como fonte primária de incentivo à pesquisa em todo o planeta. Desta forma, ter um governo aliado da verdade e da produção do conhecimento é fundamental. O elemento seguinte são as pessoas, representadas pelos estudantes de pós-graduação, que movem a roda da pesquisa. Eles precisam ter remuneração adequada e boas perspectivas para a vida profissional. E para que tudo isso ocorra, deve existir uma estrutura laboratorial que permita com que essas pessoas trabalhem adequadamente.
O desastre que se sucedeu na última década foi um corte generalizado de investimentos em estrutura, pessoal e um crescimento no negacionismo, que obviamente está a serviço das elites dominantes. Um país que não produz solução para os seus problemas não pode ser independente. Ele compra suas soluções dos outros e financia as bolsas de pós-graduação e a ciência de quem produziu tais soluções. E neste ciclo de empobrecimento científico, resta a exploração dos recursos naturais (vender minérios e comprar aparelhos celulares). Mas como todo mal não dura para sempre, o Brasil voltou a acreditar no potencial de sua gente. A ciência voltou a ser relevante para o país e o triângulo do fogo da ciência voltou a ser centro das atenções.
É importante destacar, no entanto, que a religação do sistema não é simples. Muitos cérebros saíram do país, restando muitos pesquisadores desmotivados... As máquinas quebraram e a destruição foi feia. O governo então iniciou chamadas para manutenção do parque tecnológico, aumentou o valor das bolsas, injetou recursos em novas chamadas... É nítida a reação e o interesse da comunidade acadêmica em retomar o processo, que ainda foi tripudiado por uma pandemia que manteve os laboratórios fechados por um longo período. O Brasil voltou para a pista de corrida!
E quando olhamos para a nossa posição, vemos que estamos atrás do ponto em que paramos, pois na ciência é assim, ao invés de permanecermos parados, a falta de investimento nos leva a dar vários passos atrás (as outras nações continuaram trabalhando, enquanto discutíamos o papel da cloroquina e a terra plana - a cortina de fumaça ideal). Enfim, para o momento, o que importa é que os elementos de nosso triângulo virtuoso estão cada vez mais acesos e o clima mais propício para a ciência no Brasil. É hora de recuperar todo o caminho perdido, divulgar a ciência e levar a população a entender que sem ciência não há soberania.
Helinando Pequeno de Oliveira. Físico. Professor Titular da Univasf e Vice-Presidente da Academia Pernambucana de Ciências.