Coluna JC Negócios | Notícia

Fernanda Torres e o Oscar na festa da indústria do cinema

Prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas é a festa da indústria do negócio do cinema que se produz nos Estados Unidos

Por Fernando Castilho Publicado em 03/03/2025 às 19:20

Quis o destino do mundo do cinema que a atriz Fernanda Torres deixasse de ganhar o Oscar de Melhor Atriz de 2025, perdendo para Mikey Madison pelo mesmo motivo que sua mãe, Fernanda Montenegro deixou de ser premiada em 1999 quando deixou de levar a estatueta entregue a Gwyneth Paltrow: a perspectiva de inserção no negócio global de produção do cinema.

Porque o prêmio da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas (no inglês: The Academy Awards) não é um reconhecimento do talento de artistas ou de diretores de cinema, mas a festa daquilo que a indústria do cinema dos Estados Unidos enxerga como o futuro do negócio de entretenimento.

Os demais prêmios são. E por isso as duas Fernandas foram agraciadas em vários deles. Eles existem para reconhecer o talento. O Oscar para ver quem tem mais perspectivas de escalar negócios de classe mundial. 

Em 1999, Fernanda Montenegro perdeu para Gwyneth Paltrow então com apenas 27 anos. Este ano, Fernanda Torres perdeu para Mikey Madison com 25. Em comum, as duas estavam no começo de suas carreiras e, portanto, tinham mais condições de se enquadrar no modelo de negócios da indústria.

Não é uma questão de etarismo. O Oscar premiou dezenas de atrizes com a mesma idade das duas brasileiras quando da indicação, entre elas Meryl Streep que foi indicada 21 vezes e ganhou dois de Melhor Atriz por A Escolha de Sophie e A Dama de Ferro. Por incrível que pareça, ela não ganhou em O Diabo Veste Prada.

Trata-se de como a indústria olha o artista dentro do empreendimento de bilhões de dólares que se chama cinema.

Robyn Beck / AFP
Fernanda Torres venceu o Globo de Ouro de Melhor Atriz de Drama por seu papel em 'Ainda Estou Aqui. - Robyn Beck / AFP

Isso explica -  ainda que nós brasileiros tenhamos sonhado esse prêmio por duas vezes - o fato das escolhas da Academia. No fundo os eleitores (que são também os produtores e diretores) fazem sempre três perguntas definitivas: Onde podemos encaixar esse artista? Qual o potencial dele aqui em Hollywood? Em que produção ele terá melhores chances de escalar um filme?

Claro que, assim como Fernanda Montenegro em 1999, com Central do Brasil e Fernanda Torres em 2025, com Eu ainda estou aqui existem sempre projetos nos quais elas poderiam se encaixar. Mas a indústria de Hollywood tem outros interesses.

A começar pelo fato de as duas vencedoras serem americanas e estarem começando suas carreiras e estarem por perto. E tanto as duas brasileiras como Gwyneth Paltrow, hoje com 52 anos, reconhecem isso. Não é apenas uma questão de talento. É, essencialmente, uma questão de negócio que olha para os próximos projetos.

Mas a Academia sempre está atenta ao que acontece no mundo e, especialmente, nos Estados Unidos. E ela sempre manda recados ao governo do momento e ao mundo. O prêmio de melhor filme estrangeiro é um bom exemplo de como ela sempre discorda à sua maneira. Quando a gente olha os premiados ao longo da história, o Oscar sempre foi além do talento propalado.

Divulgação
Fernando Montenegro Oscar 1999 - Divulgação

Não se pode desconsiderar que ao premiar Eu ainda estou aqui, a Academia está mandando um recado a Donald Trump. Tipo: olha você está se juntando a um sujeito que faz as mesmas coisas que no Brasil se fez entre 1964 e 1985. Com o agravante de que lá centenas de pessoas não puderam fazer o que Eunice Paiva fez anos depois.

Claro que no Brasil premiar Eu ainda estou aqui levou a cartasse milhões de pessoas. E é muito bom para nós como nação democrática ganhar um prêmio internacional com essa temática.

Mas o prêmio também deixou milhões de bolsonaristas fumaçando pelo fundo feito ferro de engomar a carvão. Mas o recado foi para os americanos ainda assustados com um mês de um governo que rompe uma ordem mundial de mais de 80 anos.

E quanto a isso Eu ainda estou aqui serve como uma luva para chamar a atenção para coisas simples como valores consagrados da Democracia que Trump e seu grupo parecem decididos a revisar. Não só em casa, mas ao redor do mundo. Para a alegria de Putin entre outros.

 

Compartilhe